Hora de descer do banquinho

Cíntia
3 min readApr 1, 2021

Lembrei de uma história, na verdade uma memória.

Quando eu era criança ainda e devia ter por volta dos 7 anos de idade, subi no banquinho da cozinha pra fazer uma proclamação. Nos tempos atuais não me recordo sobre o que era mas, certamente, imagino que tenha sido, alguma reflexão muito profunda sobre qualquer assunto bobo. Mentira, hahaha. Poderia ser algo sobre o almoço, mas acho que não me lembrarei mais da ideia que me ocorreu naquele momento.

A gente morava em Londrina ainda. Eu lembro que a cozinha era imensa, porque tinha “sala de jantar” dentro dos mesmos metros quadrados que a cozinha ocupava. Como explico em termos arquitetônicos? (Não sei, mas talvez seja melhor eu perguntar pros amigos arquitetos depois) (Ou eu desenho depois, pode ser) -> informações irrelevantes

Então assim: imagina a sala de jantar, mesa posta e 4 crianças esperando a mãe colocar os pratos. Eis que eu decido, repentinamente, que aquela seria a ocasião ideal para proclamar a ideia que estava na minha cabeça. Então subi no banquinho de madeira e com o garfo (sem ponta, de criança) em punho eu disse:

“Atenção, atenção!” Antes que eu sequer finalizasse a atenção, o banquinho tombou (ou eu me desequilibrei) e estatelei no chão. Quando me levantei reparei que tinha caído com o cotovelo espetado no garfo, embora as pontas do garfo fossem arredondadas, meu cotovelo cravou e ele ficou pendurado. Eu tenho essa cicatriz até hoje.

“Olha mãe, o garfo tá pendurado", e eu ria e chorava ao mesmo tempo. Ria da situação, mas chorava de dor. Minha mãe me repreendeu, por que eu fui subir no banquinho? Depois ela passou Merthiolate e Band-aid enquanto eu reclamava de dor e ria ao mesmo tempo.

Eu tinha algo a dizer, mas agora não recordo. Acho que nunca lembrarei o que tinha a dizer de tão importante que precisasse chamar a atenção da cozinha toda, e eu nunca pensei que fosse realmente algo importante.

Resumindo, atualmente eu tenho subido em muitos banquinhos pronta a dizer algo. Muitas vezes eu tomo o cuidado de descer antes de abrir a boca, mas às vezes me esqueço e desembesto a falar coisas demais e às vezes sem razão nenhuma. Tem dias que eu caio enquanto falo, tem dias que antes mesmo de abrir a boca eu já estou no chão, mas tem dias que eu falo e sou aplaudida. Não sei o que essa parábola tem a me dizer, talvez nada. Mas eu sinto essa sensação vibrando: a vontade de me erguer para dizer algo, o desequilíbrio pela ansiedade de resolver a tal questão e, por fim, a queda.

Lembrei de outra história que já contei em outro texto: quando ainda tomava remédio controlado pra insônia e ansiedade, eu, no desespero de sentir alguma coisa, me desembestei a beber mesmo após tomar o coquetel antidepressivo. Até que, respondendo à ansiedade da minha amiga que estava comigo bebendo, fui até ela ver o que ela precisava. Quando cheguei na cozinha, tudo ficou preto, de repente, um apagão. Não levou mais que um minuto pra eu “acordar" e perceber o que tinha acontecido, e então eu ri e ainda no chão senti minha amiga tropeçando sobre mim, porque na loucura dela, ela também não tinha me visto. Por azar, ela caiu de cara no chão, com a panela quente na mão e eu, ainda rindo, perguntei o que tava acontecendo. Ela se recobrou e me perguntou por que estava no chão. E eu ri de novo. E ela riu. E ficamos as duas rindo porque a gente já nem sabia mais se o que tava acontecendo era real ou era um sonho. O ex-marido dela, no dia seguinte, falou pra ela: “vocês duas poderiam ter morrido".

É verdade.

Mas o que essas duas histórias têm em comum?

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